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Mostrando postagens de 2012

Detalhes Sórdidos

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A vida não economiza nos detalhes sórdidos.     Eu continuo esperando as cores de Frida Khalo que    você    me prometeu, mas não sei o que me aguarda na    próxima estação das águas. Arrumo malas, observo a chuva, pronta para mais um feriado solitário no Morro dos Ventos    Uivantes. De vez em quando, esmago dragões com as pontas dos dedos. Eles soltam pequenos gemidos de prazer  e exalam um odor de flores-cadáver. Não, a vida não economiza nos detalhes sórdidos. A morte avisa pelo facebook que recrutou para o seu exército de desvalidos, o irmão de    Sofia. Tomo um suco de berinjela, prá me reanimar do choque, mas minha garganta está fechada. Quero gritar o seu nome, mas não consigo. Está tudo tão solto e desconexo na minha cabeça, que não me reconheço, mais. Sou    a versão feminina do Bispo do Rosário: junto paus, pedras, trapos, sucatas no intento de construir um barco seguro prá nós dois,  mas as tsunamis da vida

Morgana

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Ela se olha no espelho e se descobre Morgana, a fada poderosa de Camelot. Não teve o amor do pai, de Lot teve sexo e não sabe aceitar a mão estendida de Arthur. Morgana é rainha de um reino imaginário. Um reino que existe do outro lado dos espelhos, nas profundezas dos lagos. Ela é rainha das sombras. Seus domínios não são deste mundo. Ela conhece o gosto do alho, das teias de aranha e das unhas ressequidas dos pés. Ela sabe a receita das poções mágicas e consegue ler o livro que todo homem trás escrito em seu coração. Morgana é a mulher que nos habita desde que Eva sentiu o gosto da maçã, desde   que Maria concebeu Jesus desde que Madalena deixou-se beijar por Cristo. Morgana existe em mim e em você. Ela é a nossa mulher atávica. Ela tem o dom de fazer lindas tranças com nossos cabelos.   E perfumar-se com óleo de rododendro para as intensas noites de amor com seu cavaleiro negro. Ela compreende a língua do

Fantasmas nossos de cada dia

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A gente foge dos nossos fantasmas, mas eles nos perseguem vida afora. Fechamos portas e janelas, mas eles se esgueiram pelas calhas do telhado, nos espiam pelos furos das telhas, pelos buracos das fechaduras e  adentram, sorrateiros, nossas casas. Se escondem dentro dos nossos armários, vestem as nossas roupas. E nos espreitam, cínicos, pelo olhar das tias e avôs ( mortos) asfixiados em seus retratos. Os nossos fantasmas comem os restos dos nossos pratos.

O cão em eterna vigília

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O cão em eterna vigília I E o cão fez vigília à minha porta, na noite escura. Tentei acender uma fogueira de gravetos, recolhidos durante a jornada, mas eles estavam molhados. O vestido branco bordado com poemas, não me serve mais. Caminho nua. em meio à tempestade. O barqueiro passa ao longe com seus lampiões acesos no convés, mas não me enxerga na noite densa. O anel de pedras coloridas ainda brilha no meu dedo indicador. Ele poderia ser a minha bússola, mas não é. II Eu me desoriento na penumbra, em meio aos cadáveres que teimam em se levantar de suas tumbas. Mas sigo em frente. Não temo o açoite de raios e trovões que ribombeiam sobre a minha cabeça. Insisto. A estrada é escura a minha frente. Mas uma lua de prata, ilumina-a, vez ou outra. Os javalis uivam a minha passagem. Os cães ladram. As crianças choram e pedem pão. Mas dentro de mim, só trago ausências. Desilusões. Perdas. Um punhado de dentes cus

Sob o signo do fogo

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Um vento estranho, com cheiro de fumaça, adentra as janelas nesta manhã de setembro. Ainda estamos no inverno. Mas o calor resseca nossas mãos. Enruga nossas caras. Um inverno que brinca de esconde-esconde com as estações do ano E teima em trocar de roupa com o verão. Crimes são cometidos em nome da estiagem das águas. Ateiam fogo às casas, como se fossem de papel. Nunca mais será o mesmo, o sorriso das crianças sem lar. - nunca mais -  Os rostos amargos das mulheres, estampados nos jornais são a cara escarrada dos nossos tempos loucos.  Nossos pulmões expelem um gosto de fuligem. Cuspimos a fumaça das casas dos homens pobres - queimadas-  pelos homens ricos e despudorados. A primavera, balança o futuro do outono em seus braços, mas estende às sombras das àrvores, um tapete ressequido de flores mortas. A terra abre-se em fendas. Lábios rochosos escancarados soluçam por uma gota dágua. No de

Eleonora

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Não mais poderei encher o jarro Com as águas fluídas do lago. Ajoelhada as suas margens, Assusto-me com minha imagem _túrgida, fugidia— O buquê de lírios brancos Caem dos meus braços Ressequidos. Como as águas secas do lago Foi-se embora o frescor de Eleonora.

Não quero ir, não quero ficar

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                                                                                                                                                            Para Carmem Quartim Madia e Lilian Shimizu Meu corpo inteiro dói. As horas não passam. Mastigo dentes, com gosto de raízes do tempo. Gosto de terra crua. Chão batido. Um vento uivante e um lobo me espreitam, na esquina da rua. A casa rescende ao cheiro de jasmim. As pétalas reascendem seu aroma fantasmagórico, mesmo mortas. Não quero ir, não quero ficar. O dia não passa. Arrasto correntes.Estico rugas. Prendo um sorriso trôpego, na cara amassada. Nas orelhas rasgadas, um par de brincos. Enferrujados. Nada nos bolsos. Nenhuma artimanha ou subterfúgio, nas gavetas do criado mudo, resiste as manhas do tempo e seu coelho maluco. Quebro espelhos e todos os relógios do mundo. O tempo não pára. E não passa. Se arrasta. Me arrasto. Fico de quatro. De cócoras. No quarto escuro que me hab

Poema para um minotauro azul

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As taças tilintando sobre a mesa. As mãos que se cruzam e se tocam. Quase uma prece. Das taças vermelhas escorrem gotas do borbulhante champagne. Olhos. Bocas. Decotes.Fendas. Tudo é penetrável e impenetrante. Saliências e reentrâncias. O tronco da figueira,  desenrola-se para o céu, e faz-se de teto para os amantes em fuga. O gozo é azul e a fruta do amor é do tamanho de um elefante preso pelo rabo, no elevador. As taças se encontram às escondidas no reflexo do espelho. Miram-se. Tocam-se. E se derretem em gotículas de prazer. O silêncio das bocas traduz o desejo das línguas. Bocas entreabertas degustam o sabor do não dizer...só sentir... o desejo imenso de escorregar dedos pelos tecidos molengos, sedosos, tão safadamente sedutores de sua longa e malemolente saia vermelha. Picasso e o seu minotauro dançam um flamenco manco nas varandas espanholas de uma tela à meia luz. Seu sorriso é tão doce e cruel que não terei

A Chave do Amor

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Trago a chave do baú pendurada ao pescoço. Várias vezes ao dia, costumo visitá-lo, às escondidas de mim. Me olho no espelho. Experimento um colar, sobre o meu colo nú. Visto um vestido antigo e danço sozinha uma melodia que só eu ouço. Só eu consigo fechar os olhos e sentir os acordes, de cada instrumento. A música é fria como lâmina e corta o meu coração em duas metades. Metade eu. Metade você. Danço. Danço. Danço. Mas não te encontro mais neste imenso salão de baile, onde as luzes estão apagadas e as bailarinas esqueceram as sapatilhas. De súbito, a música cessa. Eu me dispo do vestido e do colar e os trancafio no baú, novamente. Mas continuo com a chave pendurada junto ao meu peito. Durmo e sonho que à noite, você virá buscar-me e precisará desta chave, pra abrir todas as portas de nossos destinos: _ enfim, e para sempre, juntos. (poema dedicado às personagens do livro

Lua embriagada

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Foto by Marisa Rodrigues Dracena, SP - 2012 Breu!!! A lua bêbada inebriou-se com as àguas [desbragadas ] das chuvas e recolheu-se [aos túneis do céu]

Setembro

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Setembro chegou, de braços dados com a primavera. Meu corpo cobre-se de folhas.  Os pelos do corpo cobrem a pele do tronco, que já foi árvore. Raízes que já foram galhos, hoje são meus pés, fincados no chão. Para sempre. Sento à minha própria sombra e colho os cachos das acácias. O perfume dos ipês. A magia dos jasmins. Faço uma tiara dessas flores misturadas e enfeito os meus cabelos já brancos e desprovidos de qualquer vaidade. Não dá prá tingir a beleza do tempo com os tons vermelhos ou azuis, artificiais.  Setembro, teu outro nome é poesia, natureza em festa, passarinhos na minha varanda, oferendas de maçãs e cravos para Afrodite, arranjos de rosas com essencia de pitanga para Yansã e Yemanjá.

O azul sinistro do dia

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Acordei assim, recolhida ao azul sinistro do dia. Uma flauta celta despertou-me de meus sonhos longínquos, onde o fauno do labirinto me convidara para um chá das cinco, regado a ópio e cogumelos. ... Demóstenes estaria lá, a esperar-me na porta do inferno, mas, antes que eu pudesse apertar sua mão, selando nosso pacto de silêncio, o castelo de cartas desabou sobre nossas cabeças. O toureiro, meu herói de capa e espadas, não se apresentou no horário marcado. E eu e o touro, cá estamos, exaustos e abraçados, sem forças prá encarar mais um dia, que não sabe se chove ou se fica quieto, mas tem a dignidade de um batom vermelho.

O azul do meu dia

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Imagem:Michel Ogier E o azul do meu dia é  da cor cinza escuro do meu pranto. Esse manto tecido ponto a ponto por uma mão invisível. Mãos que manejam terríveis agulhas Numa malha infinita. Que tricotam os pontos nevrálgicos do meu destino, com a paciência de um  chinês. Um velho   que navega seu barco por um rio leitoso cheio de curvas e cascatas, sem medo do despenhadeiro logo à frente. É assim o azul do meu dia, feito de cacos de vidro e lágrimas. Um destino bordado pelas mãos calejadas do barqueiro. Esse incansável obreiro do tempo, esse eterno atravessador de almas. é assim o azul do meu dia, misto de cacos de vidro e lágrimas.

Flores secas

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O cachorro dormindo ao pé da porta. A enchente.  O guarda-roupa e seu destino de traças. O velho baú sisudo, esquecido em um canto do quarto. Tento abrí-lo, mas a fechadura está emperrada. Um baú de lembranças que agora são ossos. Poeira no desorizonte da estrada. Estrada que não queria ter percorrido. Sozinha. Como era bom banhar-me nos rios da minha infância.  Rios que corriam límpidos, pelos olhos das minhas irmãs.  O mergulho cego do alto da ponte.   O sapato de boneca. O cabelo trançado.  O vestido vermelho.  As imagens dos homens de outros planetas  que chegavam numa caixa.  Os lábios secos.  A vagina sangrando. Um caderno em branco e a falta de caneta.   E a internet que não conecta nada a lugar nenhum. Um pastel de feira.  Uma camiseta rasgada. Um dente quebrado. Da estronca, a dentadura sorri prá mim, zombeteira. No quintal, o mato cresceu  e tomou conta dos beirais da casa. A jabuticabeira nunca mais floriu. Os pés d

Beijo

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                                                               Foi ali, no antigo Bar Brahma, na mais famosa esquina de São Paulo, entre a Ipiranga e a São João que a minha boca se encontrou com a sua e eu construí a minha mais gostosa rima. (poeminha escrito numa noite chuvosa, de um longínquo dezembro de 1994)

gato e rato

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Eu e a vida                                                                     estamos brincando de gato-e-rato. Poema: Marisa Sevilha Rodrigues Imagem: Catrin Wlez-Stein

Quando te tenho

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 Quando te tenho flores pulam de galho em galho pássaros fazem piruetas e minhas bocas dão cambalhotas. (depois) você me vira as costas meu coração calça botas e salta a janela da noite: - tenta buscar o ponto exato de onde provém a dor.

Seis da tarde

Seis da tarde: os homens viram sombras, mas nem se dão conta. Continuam andando, apressados. Andam, andam, andam mas não saem do lugar. Comum.

Tributo

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Mensalmente entre cólicas e prantos pago o tributo por ter nascido água.

Banco de espera

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Foto by Izabel Demarchi Amo as coisas velhas. As coisas velhas e feias: - um chapéu sujo esquecido num banco de espera. Um banco branco de um hospital. Numa inútil espera (o chapéu).

Deleites da Lua

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Aqui, nascido da terra, sobre o rumorejar das águas, Entoando sua música e carregando o fardo da luz, Abrigando o dia em meu peito, como um filho sorridente e radioso... Aqui posso falar baixinho, sem que me ouçam, sem temer a noite. Caminhar sozinho... acaso era esplendor aquilo que nos ligou, imersos no tempo, quando o verão solta suas madeixas? ... Amamos as sombras e os desenhos com que elas juncavam o chão. Místicas tapeçarias, desfazendo-se no ar abafado. Foi naquele dia... e a noite revelava outra história, pontilhada de árvores esguias. Surgiam fantasmas das estrelas e havíamos ambicionado a glória, Sussurravam para nós, falavam de paz, na brisa lamentosa, Diziam de uma fé antiga, morta, que o dia abalara, A juventude era a pequena moeda que comprava os deleites da Lua; Aquela era a urgência que conheciamos e a língua que importava Aquela era dívida que pagaria para outubro, o usurário. Aqui, no mais fundo dos sonhos, junto às aguas que não trazem do pa

Poema para um cavaleiro andante

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                                                                               I Oh, meu doce faquir, encantador de serpentes, leva-me contigo para um país distante, onde o pão se debulha na mesa e os grãos de arroz desabrocham como flores, nos campos ensolarados do senhor. Senhor das tempestades, Não me açoites com teu chicote de tiras e dentes, pois noite e dia sou a mulher que te espera, Com uma eterna ânfora para refrescar a tua fronte, Com leite e mel, prá recarregar o teu farnel. Toma-me nos braços e bebe o meu vendaval de amor. II Senhor dos oceanos, Aplacas a ira das minhas ondas estelares. invades as minhas ilhas interiores, molhas com tuas àguas abundantes minhas terras ressequidas e rochosas, pois a sofreguidão de tua fome,  secularmente,  me seduz.  III Príncipe das marés, tuas mãos espalmadas percorrem-me nádegas e flancos, ancas, pernas e coxas, se desabrocham em flores

Inquilina do Amor

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Ajoelho-me as tuas margens. Arrasto-me. Arrasada, ergo os olhos para tuas encostas. Tuas intangíveis escarpas. Como alcançar-te no ponto exato, onde te perdi? Muralhas.Mulheres. Outras mãos deslizando sobre tua pele. Escalpo. Florete. Mandarim. Um olho cego desnorteia-me nessa procura obscura. Perdi o mapa do teu peito. Florestas. Tramas. Ramas. Tento decodificar os arabescos indecifráveis. Teus rastros deixados em minhas paredes uterinas. Hieróglifos. Caracteres de uma escritura sagrada. Eu tinha a bíblia do teu amor, aberta, sobre a minha penteadeira, Mas não a li. Escovas. Cabelos. Arlequins. Experimento novas e antigas máscaras. Vejo-me no espelho e não reencontro mais o meu rosto. Mestre. Mastro. Maestro. Tua deixaste de reger a orquestra de sinos de ventos, que cantarolavam em mim. Nas insones noites, feitas de longas despedidas e ausências. Abandonaste a casa que te serviu de abrigo, na escuridão dos meus dias

Pote quebrado

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Pote quebrado água chora nos vãos dos cacos.

Sacos de estrelas

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Brotar da escuridão da noite e voltar,  derrepente,  para o meio daqueles que me deixaram insepulta. Destino de louco é andar pelo mundo, c arregando sacos de estrelas. Ilustração: José Emroca Flores