Flores secas
O cachorro dormindo ao pé da porta.
A enchente.
O guarda-roupa e seu destino de traças.
O velho baú sisudo, esquecido em um canto do quarto.
Tento abrí-lo, mas a fechadura está emperrada.
O guarda-roupa e seu destino de traças.
O velho baú sisudo, esquecido em um canto do quarto.
Tento abrí-lo, mas a fechadura está emperrada.
Um baú de lembranças que agora são ossos.
Poeira no desorizonte da estrada.
Estrada que não queria ter percorrido.
Sozinha.
Estrada que não queria ter percorrido.
Sozinha.
Como era bom banhar-me nos rios da minha infância.
Rios que corriam límpidos, pelos olhos das minhas irmãs.
O mergulho cego do alto da ponte.
Rios que corriam límpidos, pelos olhos das minhas irmãs.
O mergulho cego do alto da ponte.
O sapato de boneca.
O cabelo trançado.
O vestido vermelho.
As imagens dos homens de outros planetas
que chegavam numa caixa.
Os lábios secos.
A vagina sangrando.
O vestido vermelho.
As imagens dos homens de outros planetas
que chegavam numa caixa.
Os lábios secos.
A vagina sangrando.
Um caderno em branco e a falta de caneta.
E a internet que não
conecta nada a lugar nenhum.
Um pastel de feira.
Uma camiseta rasgada.
Um dente quebrado.
Uma camiseta rasgada.
Um dente quebrado.
Da estronca, a dentadura sorri prá mim, zombeteira.
No quintal, o mato cresceu
e tomou conta dos beirais da casa.
A jabuticabeira nunca mais floriu.
No quintal, o mato cresceu
e tomou conta dos beirais da casa.
A jabuticabeira nunca mais floriu.
Os pés de laranja foram cortados pelos homens esquisitos.
Os cães doentes foram sacrificados.
Um mendigo pede comida
prá vender para outro mendigo.
Um mendigo pede comida
prá vender para outro mendigo.
Um homem cortou a
própria mão, furou o olho de outro homem, mas acaba de sair da cadeia.
A cafetina mantém as putas tristes
prá garantir o seu champagne
e um pegnoir de seda, já meio gasto.
A peruca loura e os cílios postiços.
prá garantir o seu champagne
e um pegnoir de seda, já meio gasto.
A peruca loura e os cílios postiços.
O tempo,
cavalheiro indigno da minha esperança,
bate palmas no portão
e me deixa um ramalhete.
cavalheiro indigno da minha esperança,
bate palmas no portão
e me deixa um ramalhete.
De flores secas.
Num bilhete, me avisa que já está de partida,
e eu estou atrasada.
e eu estou atrasada.
E a internet que não conecta nada a lugar nenhum.
Dracena, 8 de agosto de 2011.
Comentários
It is a poem about the time that lapsed and left the person who is today in front of that mirror with all these memories of other (happier) times.
I like the music and invocation of this poem. This is a great one!
A enchente.
O guarda-roupa e seu destino de traças.
O velho baú sisudo, esquecido em um canto do quarto.
Tento abrí-lo, mas a fechadura está emperrada.
Um baú de lembranças que agora são ossos.
Poeira no desorizonte da estrada.
Estrada que não queria ter percorrido.
Sozinha.
Como era bom banhar-me nos rios da minha infância.
Rios que corriam límpidos, pelos olhos das minhas irmãs.
O mergulho cego do alto da ponte.
O sapato de boneca.
O cabelo trançado.
O vestido vermelho.
As imagens dos homens de outros planetas
que chegavam numa caixa.
Os lábios secos.
A vagina sangrando.
Um caderno em branco e a falta de caneta.
E a internet que não conecta nada a lugar nenhum.
Um pastel de feira.
Uma camiseta rasgada.
Um dente quebrado.
Da estronca, a dentadura sorri prá mim, zombeteira.
No quintal, o mato cresceu
e tomou conta dos beirais da casa.
A jabuticabeira nunca mais floriu.
Os pés de laranja foram cortados pelos homens esquisitos.
Os cães doentes foram sacrificados.
Um mendigo pede comida
prá vender para outro mendigo.
Um homem cortou a própria mão, furou o olho de outro homem, mas acaba de sair da cadeia.
A cafetina mantém as putas tristes
prá garantir o seu champagne
e um pegnoir de seda, já meio gasto.
A peruca loura e os cílios postiços.
O tempo,
cavalheiro indigno da minha esperança,
bate palmas no portão
e me deixa um ramalhete.
De flores secas.
Num bilhete, me avisa que já está de partida,
e eu estou atrasada.
E a internet que não conecta nada a lugar nenhum.