O TEMPO NO ESPELHO






                                                                                              Para Octávio Paz 

O tempo é um homem descabelado,
à beira do abismo, 
com um pé no passado, 
e outro no futuro, em pleno vôo cego, em direção a morte, 
ao não-tempo, às sombras que brincam de esconde-esconde 
entre as passagens secretas do sol e da lua.  

O tempo é uma mulher desesperada, 
que pare um filho atrás do outro, arrancando-os de si mesma,
e matando-os,  antes que dêm o primeiro choro;
uma mulher que tenta, sozinha, despovoar o mundo, 
com seu gesto tresloucado.

O tempo é um homem e uma mulher, 
que nunca se encontram; que vivem escondidos 
entre as dobras dos sinos, e as sombras da noite, 
que se amam, mas nunca se tocam.
Por isso, eles incendeiam o sol, 
apagam as estrelas de todas
as galáxias, 
amaldiçoam os que nascem quando os ponteiros
apontam para o infinito; 
revolvem as entranhas da terra, 
e atiçam as fúrias dos mares. 

 O tempo tem seu rosto, que ninguém nunca viu
voltado para o futuro. Nunca pode dar uma trégua. Voltar-se para o passado, 
parar no presente. 
Conhecer-se. 
O tempo é condenado a viver de costas
para si mesmo.
O tempo se olha no espelho,
e nada vê. 
Imagem: Carin Welz-Stein

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