Peleja com fantasmas



Nas armadilhas do tempo me emaranho,
musa dos poetas malditos e descalços,
vestida com o manto da noite, cravejado de estrelas
em busca da rosa dos ventos
que me indica estradas 
que não quero percorrer,:
 _lá, existe um norte, porém sem atalhos.

Eu tenho medo das ruas sem saída, 
dos bêbados da minha infância, 
do homem assassinado da casa em frente à minha, 
do seu caixão de madeira vagabunda,
 pingando sangue
ainda fresco no chão.

Tenho medo do homem que chicoteava a mulher, 
à beira de um barranco.
Medo da cobra que tentou morder meu irmãozinho,
no quintal, embaixo do pé de manga;
medo da convulsão dos anjos no meu enterro
de mentira.
A morta não era eu.
Mas eu me vi sendo enterrada viva
no lugar da virgem noiva-cadáver.

Os lábios do noivo 
-- intatos ao beijo --
para sempre. 

Lábios que eu desejei beijar
e por isso, castiguei-me 
em seu sepulcro, ainda fresco, 
ainda cheio de margaridas
e abraços de adeuses.

Mãos que me afagaram nos meus pesadelos
cabelos emaranhados no fundo do lago,
onde  me afogo todas as noites, 
pelejando com meus fantasmas.

Ilustra: Michelle Mia Araújo

São Paulo, 20 de Julho de 2014. 





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