Saint Francisco Night





Põe mais uma ficha na Juke Box
e cantarola baixinho:
"saint franciscooo niiiight", 
meio rouca, pigarreando cigarro
e uísque barato. 

O bordel está às moscas. 

Só um trio de bêbados 
ainda teima 
em tomar uma ultima cerveja.
Ela já os expulsou algumas vezes. 
Eles insistem em ir ficando, 
noite adentro.
Seus corpos vão se desfazendo,
malemolentes, aderindo - esponjosos -, 
às cadeiras, às mesas.
Agarram-se às garrafas.
Apertam-nas contra o peito. 

Quem sabe no último gole, 
a flor da esperança
aflore na borda dos copos, 
penetre suas gargantas, entranhe suas 
raízes em seus corpos mal-cheirosos
e lhes devolva alguns centímetros cúbicos
de vida. 

Saint Franciscooo Niiiight, 
cantarola, baixinho, a cafetina triste, 
a cabeça pendendo, jogada prá trás,
despencada sobre o sofá.
 Sorri um riso amargo, 
mas ainda mantém os dentes muito brancos:
"cartão de visitas da casa", 
repete, zombeteira. 
Os cabelos, agora, ruivos, são os mesmos
encaracolados, 
do dia de sua primeira comunhão. 

O vestido branco. A hóstia consagrada. 
O vinho tinto de sangue. 
O cálice roubado da Igreja é o seu troféu,
sobre a cômoda. 
Sempre quisera ter um objeto dourado como aquele,
 mesmo sem serventia nenhuma, 
só prá ostentá-lo ao lado da bíblia, 
que nunca leu. 

Quisera fugir de casa, 
todas as noites. 
mas o lagarto amarelo 
estava lá fora,
espionando-a,
com sua língua comprida. 

A porta sempre trancada 
com correntes e cadeados. 

Um dia criou coragem 
e pulou
pela janela do quarto. 
Subiu na garupa de uma moto
e foi embora. 
Para onde, nunca soube. 
Nunca mandou notícias, 
nem prá si mesma. 

Janeiro, 16/2014.






Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O canto da carroça

Nésperas do esquecimento

Valsa com a morte